Defesa Eficaz dos Animais: Copiando do Livro de Regras das Empresas

por Bruce Friedrich

Introdução

Ao longo dos anos, verifiquei que as pessoas empenhadas num mundo melhor estão muitas vezes subjugadas pela enormidade do sofrimento, e trabalham tanto que nunca param para ponderar a eficácia ou a perspectiva mais alargada. Mas se queremos ter o máximo impacto que conseguirmos, acredito que temos a obrigação moral de parar, dar um passo atrás, e pensar estrategicamente sobre as formas mais eficazes de diminuir o sofrimento.

É sempre bom dar um passo atrás e pensar no nosso objectivo básico. O movimento pelos direitos animais luta para que se aplique a todos os animais a Regra de Ouro, “Faz aos outros o que querias que te fizessem a ti”. Então, em termos mais directos, estamos a tentar responder à questão “Se fosses uma galinha enfiada numa gaiola, incapaz sequer de estender uma asa, se fosses a mãe porca na jaula de gestação, envolta nos teus próprios excrementos, sem nunca conseguir dar um passo em qualquer direcção, se fosses um das dezenas de milhares de milhões de animais a quem se nega qualquer desejo e que são horrivelmente abusados, o que querias que os activistas dos direitos dos animais fizessem? Como querias que eles se comportassem?” Eu estive nessas pecuárias industriais, e estive nos matadouros; o nível de abuso, o nível de desânimo nos olhos dos animais… nem consigo descrevê-lo… parte-me o coração. Não acredito que qualquer um de nós consiga verdadeiramente empatizar com o seu nível de sofrimento e de dor, mas devemos-lhes essa tentativa.

No entanto, a empatia não é o suficiente. Nem sequer a acção arbitrária. Temos sempre de ser conscientes de que sempre que escolhemos fazer alguma coisa, estamos a escolher não fazer outra coisa diferente. Portanto é crucial que nos esforcemos para usar o nosso tempo da forma mais eficaz possível. Uma das razões mais comuns de errarmos é que, mesmo trabalhando muito duramente e mesmo sendo dedicados aos animais, e fazendo do nosso activismo uma prioridade, poucos de nós se esforçam para se tornarem mais eficazes. 

Precisamos de trabalhar de forma tão dura — e, o que é mais importante, de forma tão inteligente — como as pessoas em Wall Street trabalham para vender acções e os anunciantes trabalham para vender o último SUV (carro todo-o-terreno). Apesar de os nossos objectivos serem diferentes, os mecanismos de chegar a outras pessoas e de difundir a nossa mensagem (no nosso caso, da libertação animal), estão bem estabelecidos.

O objectivo deste ensaio, “Copiando do Livro de Regras das Empresas”, é discutir formas de sermos mais eficazes. Há dois “livros de regras” que quase todos os negociantes bem-sucedidos já leram — Os 7 Hábitos das Pessoas Altamente Eficazes de Steven Covey e Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas de Dale Carnegie.

Se estes dois livros podem ser usados para vender produtos e fazer dinheiro, também podem ser usados para ajudar os animais. Recomendo vivamente que cada activista dos direitos dos animais leia ambos os livros. Precisamos de levar o nosso activismo pelos animais de forma tão séria como as grandes empresas dos EUA levam a sério o fazer dinheiro. Nos próximos parágrafos vou dizer as ideias que acho mais úteis. 

O Essencial de Covey: Estabelecer Prioridades

No livro de Steven Covey Os 7 Hábitos de Pessoas Altamente Eficazes, o que achei mais valioso foi um conceito a que ele chama “a tirania do urgente”. Basicamente, Covey sugere que a maior parte de nós estamos tão atarefados com a torrente infindável do que vem a seguir – correio electrónico no ecrã, telefone a tocar para esta ou aquela emergência, e por aí em diante— que não temos tempo para nos focar em realmente alcançar algo. Quantas vezes pensámos, “não realizei nada” no fim do dia? Covey dá-nos as ferramentas para nos assegurarmos que esses dias são tão pouco frequentes quanto possível, ajudando-nos a focar em dar prioridade ao que é necessário, eficaz, e orientado para objectivos, em vez do que estiver por acaso à nossa frente. Coisas como fazer cursos, melhorar as nossas capacidades de defesa dos animais, organizar a nossa vida, e, claro, o próprio trabalho de fazer o que é necessário para alcançar tantas pessoas quanto for possível— estas são as áreas onde devemos focar as nossas energias para sermos tão eficazes quanto possível.

Tudo isto parece óbvio, mas o facto é que a maior parte de nós não vê o mundo desta forma. Especialmente naqueles que estão a lutar por tornar o mundo um sítio mais simpático, o sofrimento, a miséria, e os assuntos contra os quais lutamos são tão urgentes e omnipresentes que muitas vezes trabalhamos duro, muito duro, mas não tão eficazmente como poderíamos — fazemos o que aparece, o que é mais imediato, em vez de fazermos o que ajuda mais. Lemos cada artigo sobre animais e respondemos a cada mensagem de correio electrónico que venha com um título todo em maiúsculas. Mas a maior parte dos artigos não ajuda o nosso activismo, e se respondêssemos a cada alerta urgente no correio electrónico, acabaríamos por não fazer mais nada. 

Uma coisa que agora faço é acabar cada dia com uma lista de coisas que vou cumprir no dia seguinte. Desligo o meu correio electrónico e não atendo o telefone durante partes significativas do dia, de modo a que possa acabar uma edição num livro ou uma análise a um projecto ou rever novos vídeo obtidos secretamente ou preparar um memorando para estratégia a longo prazo. Este tipo de coisas não são urgentes, poderiam esperar, mas são muito importantes. Desligo a torrente de coisas “urgentes” que na realidade não precisam da minha atenção imediata, e realizo algo.

O Essencial de Carnegie: Verdades que os nossos Pais nos disseram

Outro livro que oferece algumas dicas muito úteis para a defesa eficaz dos animais é o livro Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas de Dale Carnegie, que poderia facilmente ter outro título, “Os Aspectos Básicos da Natureza Humana”. Algumas das histórias são divertidamente desactualizadas, mas no geral, é um livro sobre prestar atenção e ter compreensão nas nossas interações com os outros. 

• Princípio De Carnegie Nº 1: Vestir Bem Para Ter Sucesso

O primeiro princípio de Carnegie que quero abordar é que devemos ter uma boa imagem estética, de modo a que a nossa aparência não distraia os outros da nossa mensagem: o sofrimento dos animais.

Durante anos, no início da década de 1990, tinha uma barba comprida e cabelo até aos ombros, vestia apenas roupas que achava que mais ninguém queria, e recusava-me a tomar banho mais que uma vez por semana. Garanto-vos que desde que passei a ter uma aparência conservadora, persuadi muitas mais pessoas a tornarem-se veganas.

Pergunta-te, se fosses a galinha na pecuária industrial, drogada e seleccionada através das gerações para que não te pudesses sequer levantar, ou o porco no matadouro, afogando-se em água a ferver, como quererias que os teus defensores se vestissem? Eu não acredito que o nosso desejo pessoal de rejeitar as normas da sociedade tenha sequer uma fracção da importância de defender eficazmente os animais. 

Se o nosso objectivo é ser tão eficaz quanto possamos ser em nome dos animais, é absolutamente essencial que consideremos os nossos desejos pessoais como secundários relativamente ao desejo dos animais de nos ter como defensores eficazes. 

Obviamente, há locais onde o cabelo verde, piercings, e roupa rasgada são perfeitamente aceitáveis, mas na maioria das situações, quando rejeitamos os padrões da sociedade, estamos a limitar a nossa capacidade de ajudar os animais. 

Este argumento aplica-se também à saúde. Fico sempre espantado pelos defensores dos animais que ignoram a sua própria saúde. O facto é que se tens uma aparência insalubre ou letárgica, serás menos eficaz como defensor. Se estás frequentemente doente, morres de ataque cardíaco, ou acabas na ala de quimioterapia, estás a passar uma má imagem do veganismo e já não estás a ajudar os animais! Além disso, se a tua dieta consistir de alimentos “lixo” (junk), outros potenciais veganos pensarão que isso é tudo o que os veganos comem, e será menos provável que eles queiram ser veganos. 

• Princípio de Carnegie Nº 2: Ser Respeitoso

O segundo princípio é ser sempre respeitoso, mesmo que a outra pessoa pareça não o merecer. Ser descortês ou dizer algo agressivo nunca é eficaz.

Tento ir às ruas para distribuir panfletos e falar com as pessoas, pelo menos uma vez por semana. Às vezes as pessoas dizem algo pouco simpático. No passado, devolvia logo o insulto. Isto geralmente fazia-me sentir bem. Ah! Disse-lhe o que merecia! Mas a minha reação prejudicava os animais.

Em primeiro lugar, responder no mesmo tom não influencia a pessoa com que estamos a falar. Podemos pensar que algumas pessoas simplesmente não são receptivas, mas posso dizer a partir da minha experiência que algumas pessoas que parecem ser as menos receptivas, são geralmente aquelas que foram mesmo desafiadas e ficaram à beira de mudar o seu comportamento. É por isso que reagem de forma tão defensiva. Devemos sempre tentar responder com respeito e simpatia. Não faz mal e pode mudar as pessoas que estão à nossa volta. 

Reagir com ira ou sarcasmo também magoa os animais porque alguma outra pessoa que por acaso estava a ouvir a conversa pensaria que eu não tinha humor ou que era uma má pessoa. Nesse momento, não estaria a fazer nenhum favor aos animais.

Agora eu digo algo como “Tenha um bom dia, senhor”, ou se for uma sessão demorada de distribuir panfletos, posso dizer, “Gostaria de falar sobre isso?” Não só estou a agir de forma moral aos olhos dos outros, como também fico consistentemente surpreendido por quão frequentemente consigo ter conversas excelentes com pessoas aparentemente antipáticas!

A mesma análise aplica-se aos nossos antipáticos cunhados ou colegas de trabalho na festa da empresa. Não interessa se tens razão, a questão que devemos perguntar-nos em todas as situações é “O que é o melhor interesse dos animais?” Por favor, permite-me que repita: O interesse dos animais nunca é que tu digas algo desrespeitoso para alguém numa discussão sobre direitos animais ou veganismo. 

Daqui a pouco falo mais sobre conversas difíceis em jantares, mas primeiro… 

• Princípio de Carnegie Nº 3: Instiga – Não Castigues

O terceiro princípio vital de Carnegie é a arte de convencer as pessoas através do diálogo. Tenta não tornar a tua defesa do veganismo num monólogo — e especialmente não uma queixa (rant).

Este é o assunto em que tive mais dificuldades quando me tornei vegano. O peso de todo o sofrimento dos animais na pecuária industrial e nos matadouros enraivecia-me. Consequentemente, eu tentava à força convencer toda a gente a tornarem-se vegetarianos ou veganos, forçando-os a partilhar o meu horror e raiva. Agora estou convencido que isto não é a forma mais eficaz de convencer alguém a mudar o seu comportamento.

Quando alguém diz, “As plantas sentem dor!”, ou “Os animais comem outros animais!”, há de certeza, muitas respostas possíveis que iriam destruir a outra pessoa. Mas honestamente, as pessoas acreditam realmente nas coisas que dizem; só não estiveram muito tempo a pensar nelas. Tu tiveste esse tempo, portanto podes achar que a questão é uma estupidez, mas se o disseram, então elas não acham que seja estúpido. Portanto se tu responderes de forma que implique que elas são estúpidas, não irás convencer ninguém que estás certo — em vez disso, elas sentir-se-ão ofendidas e desinteressadas na tua opinião. Uma forma óptima de começar a tua resposta a uma dessas questões é “Isso é uma questão que ouço muito, mas se olhar para ela desta forma…” ou “Eu costumava perguntar o mesmo, mas agora vejo que…”. Estes tipos de respostas validam a outra pessoa, fazem-te ter boa imagem para quem esteja a ouvir, e continuam a discussão de uma forma que será bem mais eficaz do que qualquer outro método que eu conheça. 

Algumas pessoas dizem de propósito coisas apenas para serem ofensivas, mas posso dizer pela minha experiência que muitas dessas pessoas são alcançáveis. Temos de primeiro recusar-nos a nos rebaixarmos a esse nível e em vez disso dar uma resposta que lhes permita salvar a sua face e continuar a conversa. Se alguém é claramente antagonista, podemos mesmo dizer, “As coisas que diz parecem-me maldosas e desrespeitadoras”.

Se reagirmos desta forma, estaremos a dar-lhes um momento para abraçar a sua natureza melhor, e muitas vezes verificamos que em breve dizem algo como “Tenho uma irmã que é vegetariana”. Tenho de dizer que fico sempre surpreendido em como uma pessoa se pode comportar tão mal no início de uma conversa e no entanto mudar de ideias no fim. Mas não mudarão de ideias se agirmos agressivamente, defensivamente, ou condescendentemente.

Sei que há situações — demasiado comuns — em que nem sequer abrimos a boca e as pessoas estão na defensiva; sentem-se julgadas simplesmente porque és um vegano. Não deixes a tua raiva deixar-te raivoso. Pratica manter-te calmo e bem-disposto. Se eles falarem disso primeiro, tenta rir e dizer, “Ei, você falou no assunto. Será com todo o gosto que falo nisso, mas você parece um pouco zangado neste momento. Deixe-me dar-lhe este panfleto de introdução ao veganismo e talvez possamos falar disso mais tarde.”

Toda a gente quer que os outros gostem dela. Toda a gente se vê como uma pessoa decente. Se dermos às pessoas a oportunidade de ser ouvido — mesmo que pareça que não o merecem — podemos ser bem mais eficazes nas nossas interações. Certamente, qualquer pessoa que testemunhe a conversa ficará com uma boa impressão nossa, e, assim, dos activistas pelos animais em geral.

• Princípio de Carnegie Nº 4: Sê Optimista

O último princípio de Carnegie que quero abordar é que devemos ser optimistas, animados, e positivos. Face a tanto sofrimento, pode ser difícil ser optimista. Acredita em mim, eu sei. É tão difícil conhecer o sofrimento horrível dos animais sem estar constantemente deprimido com isso. Mas mais uma vez, temos de perguntar a nós próprios: o que será mais eficaz para ajudar os animais? A depressão e a raiva, embora compreensíveis, claramente não serão tão eficazes para os animais como uma atitude bem-humorada. Pensa nas pessoas que são mais populares. Eles são pessoas são sorridentes, animadas, que riem alto, e que se divertem. Temos de tentar ser assim.

No seu livro A Chave do Sucesso (The Tipping Point), Malcolm Gladwell analisa as pessoas que transformam as modas em tendências. Ele descobriu que em todos os casos, são amigáveis, optimistas, e interessadas pelos outros. Expressam um interesse genuíno pelos outros, e isso é correspondido pelas pessoas com que eles falam. Gladwell também oferece uma série de histórias interessantes que mostram que a forma de dizer as coisas é pelo menos tão crucial como o que é dito — as pessoas, quer o admitam ou não, são profundamente influenciadas pela linguagem corporal e pelo tom de voz. E, claro, um tom positivo e uma aparência animada são muito mais eficazes a influenciar as pessoas do que o seu contrário.

Para colocar isto em prática, imediatamente antes de entrevistas para a TV ou de ir sair para distribuir panfletos, eu sorrio em frente a um espelho e rio alto (ha ha ha ha ha). Parece estranho — mas não o desconsideres antes de o tentares. Pode realmente mudar o teu estado emocional. Isso ajuda a colocar-te num estado mental em que estás animado, mesmo se o entrevistador ou a pessoa na rua pareça ter a intenção de te deprimir.

Aprender com os nossos Erros: 5 Coisas que fazemos Mal

Para além da nossa tendência para estarmos compreensivelmente deprimidos ou zangados, gostaria de discutir também algumas outras coisas que muitos de nós fazemos e que prejudicam os animais.

• Pureza Pessoal vs. Defesa Eficaz

A principal coisa errada que fazemos — e falo porque eu próprio fiz isto durante muitos anos — é que colocamos a pureza pessoal acima da máxima eficácia pelos animais. Esquecemo-nos que o veganismo não é um fim em si mesmo, mas sim um meio de acabar com a crueldade para com os animais. Ser vegano não tem a ver com ser perfeito e não causar nenhuma crueldade — tem a ver com diminuir o sofrimento dos animais de uma forma tão eficaz quanto possível. 

Todos sabemos isto, mas vale a pena repetir: em algum nível, tudo o que consumimos prejudica algum animal. Cada alimento não-biológico que consumimos envolve pesticidas que matam pássaros e outros pequenos animais. A agricultura biológica usa fertilizante com origem animal. A colheita de alimentos veganos mata e desloca animais dos seus abrigos. Pneus de bicicleta e mesmo sapatos “veganos” contêm alguma pequena quantidade de produto de origem animal. Poderíamos ir todos para os bosques e sobreviver com base em frutos secos e bagas como “veganos de nível 10”, mas em última análise, isso seria bem menos eficaz que viver onde podemos influenciar os outros a terem também uma dieta vegana.

Os animais não precisam da nossa pureza, se fosse isso então faria sentido ir viver para uma cabana nos bosques, causando o mínimo de mal possível. O que os animais precisam é da nossa defesa dos seus interesses — e precisam que seja tão eficaz e influente quanto possível. Em última análise o veganismo não pode ser apenas sobre nós, ou então torna-se numa moda cultural narcisista. O veganismo deve ter a ver com ajudar os animais. 

Portanto a questão da pureza pessoal torna-se uma de matemática básica: adoptando uma dieta vegana significa que não apoiamos o tormento e matança de dezenas de animais a cada ano. Ajudar apenas mais uma pessoa a tornar-se vegana salvará o dobro dos animais. Mas o reverso é verdade também: se fizermos algo que impeça outro de adoptar uma dieta vegana, se o nosso exemplo coloca uma barreira onde podia ter havido uma ponte, isso prejudica os animais — e então torna-se anti-vegano, se o veganismo significa ajudar os animais.

Todos sabemos que a principal razão das pessoas não se tornarem veganas é porque acham que não é muito conveniente, e todos conhecemos pessoas cuja razão para não se tornarem veganas é que “não” conseguem abandonar o queijo e o gelado.

Mas em vez de facilitarmos que eles ajudem os animais, muitas vezes dificultamos. Em vez de encorajá-los a parar de comer todos os outros produtos animais excepto queijo e gelado, pregamos-lhe o discurso sobre a opressão que sofrem as vacas leiteiras. Então continuamos, falando de como não comemos açúcar ou um hambúrguer vegetal por causa do pão, embora uma pequena quantidade de sabor a manteiga num pão acarrete significativamente menos sofrimento que comer algum fruto ou vegetal não-orgânico, ou usar uma garrafa de plástico, ou outras centenas de coisas que a maioria de nós fazemos. A nossa obsessão fanática com ingredientes, não só obscurece o sofrimento dos animais — que seria virtualmente não-existente excepto por essa mínima quantidade desse ingrediente — mas quase garante que aqueles à nossa volta não vão fazer nenhuma mudança de todo. Então, preservámos a nossa pureza pessoal, mas prejudicámos os animais — e isso é anti-vegano.

Lembra-te sempre, sempre: O veganismo não é um dogma. O veganismo tem a ver com o sofrimento dos animais. Deixa-me dizer isto outra vez, como um vegano que já conta com 17 anos de veganismo: o veganismo não é uma lista de ingredientes ou um conjunto de regras. Ser vegano tem a ver com ajudar os animais da melhor maneira. Portanto exige reflexão, não uma lista de certos e errados. 

Portanto se estivermos numa festa com omnívoros e tu estás a dizer que não podes comer o pão porque não sabes o que está lá dentro, ou se estás num restaurante e há um hambúrguer vegetal no menu e tu importunas o empregado com imensas perguntas sobre os ingredientes ou sobre como foi cozinhado, estás a esquecer-te da essência de ser vegano. Apenas tornaste o veganismo em algo mais difícil, colocando barreiras para os outros convivas que de outro modo poderiam ter considerado a situação dos animais. Nesta situação, os outros provavelmente não quererão perguntar sobre a tua dieta, e é ainda menos provável que encarem a ideia como algo que quereriam considerar. Vê a perspectiva mais alargada e verás que o teu amor à pureza nessa situação faz significativamente mais mal aos animais do que consumir essa pequena quantidade de produto animal! Lembra-te que se apenas uma dessas pessoas seguir o teu exemplo, pode salvar centenas de animais! E se apenas uma delas pudesse tê-lo feito, mas decide não o fazer por causa do teu exemplo, o reverso é verdadeiro: tu estás a prejudicar os animais.

Se estás preocupado com o que vais comer num restaurante, liga antes do evento e vê se haverá alguma forma de teres algo que aceites, e depois pede com gosto. Se estás preocupado sobre o que vais comer numa festa no escritório, entra no comité que organiza a comida ou traz de casa alguma comida vegana fantástica. Mas por favor, nunca, nunca transmitas a ideia que preocupares-te com os animais é um frete, porque, claro, não é.

• Comendo com Omnívoros

Passei anos a recusar-me a comer com omnívoros. Por favor tenham consciência que muitos omnívoros percebem o vosso absentismo como privação, hipocrisia, ou ambos, e isso é o tipo de clube em que ninguém quer entrar. “Não podes ir a festas, não podes comer fora, etc. Quem quer viver dessa forma?”

Outra vantagem de participar em ajuntamentos é que as pessoas te vão perguntar sobre o que estás a comer, especialmente se sabem que és vegetariano. Esta é a tua oportunidade perfeita para levar um pouco de informação às suas cabeças e talvez até às suas mãos. Como foi discutido previamente, tens de o fazer de uma forma sociável, e precisas de avaliar a situação para não alienar ninguém, mas deves conseguir apresentar o argumento moral básico sem ser agressivo. 

O que faço nesse tipo de situações é tentar perceber o nível de interesse; muitas vezes podemos ter uma boa conversa mesmo numa refeição onde a carne está a ser servida, desde que nos mantenhamos sociáveis e falemos principalmente sobre as nossas crenças pessoais a favor da felicidade e contra a crueldade. Mas se parece que o vegetarianismo é a última coisa que a maioria das pessoas quereria discutir, eu digo algo como isto:

Sabem, isto é um assunto que é muito importante para mim. Eu acredito que se vissem como os animais sofrem na pecuária industrial e nos matadouros, estariam horrorizados e não o quereriam apoiar. Mas tenho verificado que ter esta discussão numa mesa cheia de pessoas é muitas vezes desagradável para algumas pessoas e não quero monopolizar a conversa inteira. Eu tenho alguns textos e alguns vídeos, e adorava falar com vocês sobre isto mais tarde. Posso ter o vosso endereço de correio electrónico? 

Bum! Falaste do assunto da moralidade E TAMBÉM ficaste a parecer a pessoa mais simpática da mesa. Todos os que, quando essa pessoa perguntou “Porque és vegetariano?” se preparavam para ouvir uma longa resposta moralista, irão dizer que tu foste muito simpático. Mas levantaste o assunto ético, o que é crucial. 

Uma última coisa que quero dizer sobre comer com omnívoros: se vais para um evento onde podes trazer comida, por favor traz alguns pratos saborosos; quando uma pessoa substitui a sua comida pela que tu trouxeste, isso é uma pequena vitória. Poucas coisas convertem pessoas tão bem como o faz a comida vegana deliciosa. 

• Marginalizando-nos a nós próprios

Se concordas comigo que o movimento dos direitos animais é o imperativo moral do nosso tempo, então espero que também concordes que os direitos animais têm de ser o nosso foco. Temos de aceitar as pessoas em todos os seus estágios e não discutir com elas outros assuntos, mesmo que nos tentem distrair. Muitas vezes as pessoas sentem-se mais confortáveis discutindo um assunto sobre o qual pensaram mais, por isso, em resposta ao nosso vegetarianismo, irão perguntar sobre a nossa posição sobre aborto, Deus, ou a política. 

Se tornarmos o veganismo e os direitos animais num pacote que inclui outros assuntos, será mais fácil para os outros desvalorizarem-nos. Alguém que poderia ter considerado o veganismo pode desconsiderar-te por causa da tua posição sobre a pena de morte ou o aborto. E também há o factor “Para quê gastar tempo com isto?” visto que, por exemplo, é mais provável despertar um conservador para os assuntos animais que ainda não consideraram do que abalar as suas filosofias políticas. De facto, alguns dos melhores defensores dos animais não são progressistas, incluindo Matthew Scully, o vegano escritor principal dos discursos de George W. Bush, assim como antigos membros do Congresso como Bob Smith e Bob Dornan. O Bob Dole era muito melhor em assuntos dos animais do que Bill Clinton, e ideólogos da direita como G. Gordon Liddy e Oliver North são bem mais amigos dos assuntos animais, enquanto liberais como Bill Press e Michael Moore, são, no melhor dos casos, desdenhosos.

Além disso, se estamos a defender um tipo específico de dieta vegana, como uma dieta macrobiótica ou crua, isso poderá prejudicar os animais porque é mais complicado que as pessoas sigam essas dietas do que uma dieta vegana. E lembra-te, a maior parte dos omnívoros já estão preocupados com o que vão comer se largarem os produtos animais. A nossa mensagem deve ser o sofrimento dos animais, não as nossas preferências dietéticas pessoais, quando essas preferências não ajudarem realmente os animais. Finalmente, se estás interessado numa dieta de comida crua, por favor lê o artigo do Jack Norris sobre o assunto em VeganHealth.org. 

• Pedimos Desculpa ou Minimizamos

Outra forma em que nos limitamos é pedindo desculpa ou minimizando. Já ouvi dizer que é aceitável, se alguém nos perguntar porque somos vegetarianos, dizer que é uma “decisão pessoal e não quero falar sobre isso”. Isso ajuda os animais? Como iria alguém, ouvindo essa resposta, chegar a perceber que é uma questão moral? Não iriam — simplesmente achariam que seria a nossa maluquice pessoal.

E nunca digas que a tua alimentação tem só a ver com saúde, e nunca digas que tem só a ver com o ambiente. Podes levantar esses assuntos, de forma adicional, claro. Mas fala sempre, sempre, no efeito nos animais. Nunca chegaremos à libertação animal se as únicas pessoas que adoptam uma alimentação vegetariana o fazem por razões egoístas. 

• Não nos Preparamos ou Praticamos 

Uma outra coisa que fazemos errado — e isto é fundamental em todo este texto — é que muitas vezes não nos preparamos e não praticamos o que queremos dizer. Já todos ouvimos argumentos como “E quanto ao aborto?” e “As plantas não sentem dor?” um milhão de vezes, portanto não há desculpa para improvisar na resposta a essas questões. Devemos estar prontos para dar a melhor resposta de uma forma amigável e acolhedora.

Temos a obrigação perante os animais de dar uma resposta bem pensada e construtiva, e no entanto simples e focada, para cada questão. Se estamos nervosos ou desconfortáveis com falar em público ou interações potencialmente argumentativas, devemos inscrever-nos no Toastmasters ou num curso sobre falar em público, e devemos praticar com amigos até estarmos confortáveis com esse tipo de discussões. Treinar com vídeo e assumir personagens pode ser um exercício um pouco embaraçante mas incrivelmente útil. É cómico e um pouco intimidante, mas podes acreditar que quando acabares, serás capaz de oferecer um argumento em qualquer situação!

• Negligenciamos as Pequenas Coisas

Finalmente, temos de nos lembrar de pequenas coisas como usar pins e t-shirts, e colocar autocolantes nos nossos carros e computadores. Toda a gente que tem um carro ou um computador portátil deve ter autocolantes a dizer “Orgulhosamente Vegetariano”. Os animais nunca têm um minuto de descanso; colocar um autocolante no carro ou no computador é o mínimo que podemos fazer. Se não queremos um autocolante permanente, podemos obter uma folha magnética num vendedor que o tenha, como o Kinkos, colocar lá o autocolante, e cortar. Eu tenho autocolantes magnéticos que levo comigo para colocar no meu carro alugado, o que adoro, porque são carros novos e giros, e transformam-se num cartaz ambulante para os direitos animais.

Além disso, sempre que saímos, devemos ter um pin ou uma t-shirt e alguns folhetos. Podes ter a certeza, quando ando com mochila — o que faço muitas vezes — tenho uma pilha de folhetos da Farm Sanctuary.

A Farm Sanctuary tem óptimas t-shirts “Pergunta-me porque sou vegetariano” e panfletos que todos os activistas devem ter na sua mochila a todos os momentos.

Lembra-te, se sensibilizares uma pessoa ao vegetarianismo, salvas milhares de animais. As pessoas vêem o teu autocolante e a tua t-shirt “Pergunta-me porque sou vegetariano” e tu tens um panfleto que lhes podes dar e falar com eles. De cada vez que uma nova pessoa pensa sobre direitos animais ou pensa “Ei, eles parecem bastante normais e advogam os direitos dos animais”, isso é uma vitória para os animais. Se actualmente andas com t-shirts dos Boston Red Sox ou dos Metallica, substitui-as por t-shirts “Pergunta-me porque sou vegetariano” e sê um defensor dos animais de cada vez que andas fora de casa. 

Seja qual for o seu record, os Sox não precisam tanto da tua ajuda como os animais. 

Dicas para Começar a Discussão

É importante conseguir que se iniciem conversas positivas sobre os animais, por isso aqui ficam algumas dicas sobre iniciar essas conversas. Estas são algumas das minhas dicas preferidas.

• Ter Interesses Não-Animais

Uma coisa que podes fazer é ter interesses não-animais. Podes juntar-te a um clube de leitura, exercitar-te no ginásio na tua t-shirt dos direitos dos animais, juntar-te a um clube de corrida, ciclismo, ou passeios na natureza, ou fazer alguma actividade importante para ti. Envolve-te em algumas organizações e torna-te a voz dos animais nessas organizações. 

• Não te esqueças das Pequenas Coisas

Embora já tenha falado nisto, acho que provavelmente a melhor maneira de fazer o máximo de bem com quase nenhum gasto do teu tempo é dar prioridade a pequenas coisas como usar t-shirts, colocar autocolantes no carro e no computador, e andar com panfletos. A importância de andar com pins e t-shirts não pode ser exagerada: as pessoas vão ver essas coisas, especialmente se o teu pin as convida a falar contigo. Por exemplo, eu tenho seis t-shirts “Pergunta-me porque sou vegetariano”. Uso-as em todo o lado, e as pessoas realmente perguntam, começando conversa atrás de conversa em aviões, no metro, e em todo o lado. E mesmo as pessoas que não perguntam, têm de pensar se querem perguntar, o que também é bom, pois pensarão porque não são veganos e por que razão tu serás. Cada vez que alguém pensa no tema, se de outra forma não pensaria nele, é uma pequena vitória para os animais. 

• Distribui Panfletos 

Dá um pouco de trabalho, mas gastar algum tempo a distribuir panfletos é divertido e também uma forma incrível de defender os animais. Pensa nisto: a pessoa média nos EUA come dúzias de galinhas, porcos, perus, peixes, e outros animais num ano. Mesmo que apenas uma única pessoa se torne vegetariana depois de uma tarde a passar panfletos, isso é uma vitória enorme para os animais — centenas de animais salvos de um sofrimento horrível em apenas uma hora ou duas!

Mas posso dizer-te a partir das nossas sondagens que sempre que vamos distribuir panfletos, afetamos mais do que uma pessoa. Além disso, muitos dos que não se tornam veganos ou vegetarianos irão provavelmente ficar mais receptivos à ideia da próxima vez.  

Em vez de ir ver um filme nalguma noite de Sexta-Feira ou de Sábado, pega num conjunto de folhetos, vai onde houver muitas pessoas e distribui os folhetos. Eu vivo em Washington, DC, portanto é particularmente fácil porque há constantemente pessoas a entrar e a sair do metro. Bastam uns poucos activistas para distribuir 300 ou 400 panfletos por hora. Quando descemos o fundo das escadas, vemos talvez uma dúzia deitada fora — mas o resto está a ser lido, e muitos serão passados ou deixados nos comboios para outros lerem.

Em propriedade pública, também podes ligar o teu computador portátil ou um gerador com uma TV/VCR em cima de uma mesa e mostrar o documentário poderoso da Farm Sanctuary What Came Before. Honestamente, é simplesmente espantoso ver o número de pessoas que irão ficar de pé em frente da TV e ver todo o documentário, às vezes mais do que uma vez! Ouvem a voz do Steve O e ficam atraídos, muitas vezes colocando questões depois.

Tradução: João Madureira
Artigo traduzido com a permissão do autor.
Artigo original: https://ccc.farmsanctuary.org/be-a-better-advocate/read-essays-and-books/effectiveadvocacy/